O QUE ACONTECEU A SEIA NOS ÚLTIMOS 30 ANOS... e o que vai acontecer nos próximos 4

O QUE ACONTECEU A SEIA NOS ÚLTIMOS 30 ANOS
Listo, na segunda parte deste texto, os principais factores que, no meu entender, conduziram - e alguns deles ainda conduzem - ao despovoamento e ao crescente abandono de Seia por parte de mais de metade da população que já teve nos anos 70. Mas começo por enquadrar a história.
1 - Décadas de 60 e 70 - o Boom populacional
Quando falo de população, refiro-me à efectiva. Àquela que é por todos percepcionada. Não me refiro aos números que aparecem nos Censos, os quais, relativamente a Seia (e não só, provavelmente), sempre apresentaram dados disparatadamente erróneos.
Nos anos 60, grande parte da população, analfabeta, não respondia aos Censos. As meninas deixavam os papéis debaixo da porta e devolvia quem queria. Nem metade preenchia os formulários. Assim, quando se diz que havia 32 mil habitantes no concelho de Seia na década de 70, isso nada tem de real. Devia existir, estimo eu relativamente ao que hoje existe, muito mais do tiplo das populações em todas as freguesias. Provavelmente o quádruplo. E, na cidade, não digo que existisse o dobro, pois não haveria, à época, casas para todos, mas estaríamos lá perto, porque as anexas estavam cheias de gente. Quintela, Maceira, Vodra - então Vodra! - Arrifana e até Aldeia da Serra estavam repletas de vida.
Na Vila não havia andares para alugar nos anos 60. O meu Pai conseguiu arranjar um apartamento no prédio do saudoso Júlio Aires, em 1967, quando veio trabalhar para Seia, por especial favor de alguém que o ia deixar vago. Ficámos em Mangualde ainda uns tempos à espera que o andar vagasse e o meu Pai já vinha fazer serviço para Seia, todos os dias, para a EHESE.
Eu tinha 7 anos e vim para a Segunda classe do saudoso Professor Ferreira. Um visionário da Educação, um Homem muito à frente do seu tempo que já na altura se queixava do atavismo, da falta de iniciativa e da falta de ambição instalados entre a população residente. Os verdadeiros senenses que, à época, eram uma pequena minoria da população. E aqui já se vislumbra um dos factores que nos trouxeram até à situação com que hoje nos deparamos.
Seia atraía não só as populações rurais das freguesias limítrofes para a FISEL, FERCOL e VODRATEX (sobretudo trabalhadores rurais, não especializados que se deixaram seduzir por um salário fixo mensal que a sua micro-lavoura de subsistência lhes não granjeava), como também operários especializados e técnicos especialistas (como era o caso do meu Pai) dos concelhos limítrofes, que para aqui vieram, a convite da administração das empresas têxteis mas também da Companhia Hermínios e da Empresa Hidro Eléctrica da Serra da Estrela, um dos principais Centros produtores e distribuidores de energia eléctrica do país.
Seia constituia-se como um formidável pólo de atração de pessoas e de empresas comerciais e até industriais - serralharias, carpintarias, até fundições - que davam apoio às grandes empresas industriais mas também às milhares de pessoas que demandavam a nossa Vila todos os anos para nela virem trabalhar e constituir a sua vida e a sua família.
Em 86 Seia foi - justamente - elevada à categoria de Cidade. Mas apenas uma década depois teria início o Grande Pesadelo Senense (GPS, doravante).
2 - O GPS - Grande Pesadelo Senense
No início da década de 90, as grandes indústrias têxteis colapsam definitivamente, à semelhança do que tinha acontecido na Covilhã uma ou duas décadas antes. Recordo que Seia chegou a ser considerada “mais forte” que a Covilhã justamente durante o período entre os colapsos das respectivas indústrias têxteis. E temos que reconhecer que a nossa indústria estava, ainda assim, mais avançada tecnologicamente que a deles, algumas das quais ainda fazendo uso da força motriz da água e do vapor para fazerem mover teares em plena década de 50. Inacreditável. Por isso, entre o colapso da Covilhã e o nosso, Seia foi talvez mais importante que a Cidade “rival”. Pelo menos era isso o que se dizia nas ruas. E eu, embora ainda uma criança, ouvia-o repetir muitas vezes.
Acontece que, passado uma década ou duas, os nossos têxteis colapsaram igualmente e exactamente pelos mesmos motivos: falta de modernização tecnológica. A baixa produtividade encarecia proibitivamente o preço do nosso produto face à emergente oferta internacional.
Houve ajudas de alguns governos, houve subsídios a fundos perdidos, houve injecções de capital nunca recuperado mas mesmo assim - e finalmente - como ainda não estava instituída a prática corrente da transferência de milhões em luvas para as off-shores (onde quer empresários, governantes e banqueiros fizessem desaparecer metade dos subsídios que recebiam da CEE), a partir de determinada altura não houve forma de injectar mais dinheiro na FISEL, na FERCOL nem na VODRATEX que estavam tecnicamente mais do que falidas há anos. Pelo que a única solução para todos foi fechar a torneira e deixá-las cair.
Imagine-se agora o que aconteceria, hoje, se 6.500 pessoas em Seia perdessem o seu emprego de um dia para o outro. Bem: tal seria, hoje, impossível porque em todo o concelho não existe já esse número de trabalhadores. Mas, se existisse, Seia desapareceria do mapa. Acontece que em meados de 90 Seia não desapareceu. Porque havia tanto trabalhador excedentário que só os subsídios de desemprego e as indemnizações que, a custo, conseguiram receber, foram continuando a animar a economia local durante algum tempo.
Acresce que, como já referi, a maioria dos trabalhadores têxteis provinham de aldeias e anexas e nelas nunca deixaram de cultivar os seus terrenos e as suas hortas, pelo que o magistral choque económico que se esperava e receava foi sendo, felizmente, mitigado.
3 - Novas empresas para Seia. Onde?
Simultaneamente ao encerramento dos têxteis, aparece a primeira - e única até hoje - grande empresa que se instalou em Seia. A ARA. A multinacional alemã veio ocupar o espaço e as instalações da antiga Companhia Herminios que também tinha encerrado ou estava em vias de encerrar a sua actividade. Mais uma. E isso trouxe muita esperança aos senenses, porque se fantasiou que a seguir à ARA, muitas outras empresas se viriam a instalar em Seia, evitando que o impacto da morte dos têxteis se fizesse sentir.
Infelizmente tal não aconteceu. A ARA foi a primeira e a única grande empresa que se conseguiu captar para Seia desde o colapso da indústria têxtil. E já lá vão 26 anos desde que se instalou aqui. E 30 anos desde o GPS - o colapso dos têxteis.
Como tudo ficou parado, e não se captaram mais indústrias nem sequer empresas de média dimensão - e o turismo nunca foi visto como uma alternativa para todo o ano excepto no Sabugueiro e na Torre (já lá iremos) - desde meados de 90 até hoje, a evolução económica e populacional de Seia foi sempre a cair. Mas a pique.
4 -A falácia dos Censos
Não como indicam os Censos, que continuam errados; mas, a partir de 2000, pelos motivos opostos. Agora, a falta de rigor de 2001 e sobretudo de 2011 deve-se do facto de milhares de pessoas não terem sido encontradas nas suas habitações por terem emigrado ou migrado dentro do País, mas para outros concelhos. Vai daí continuaram a considerar-se como residentes mas não contactadas. Por não terem morrido nem se saber onde moram. Então “continuam” a morar aqui já que cá continuam recenseadas na junta de freguesia. E pronto. Ainda hoje Seia tem mais eleitores do que população. Ninguém acredita nisto, mas o Anuário dos Municípios de 2016 mostra-o bem.
Em minha casa, por exemplo, constavam, em 2011, 4 habitantes. Na realidade só morava UM em Seia. Os estudantes e os senenses que tiveram que emigrar, de forma ainda não definitiva, continuam a ter oficialmente a sua residência em Seia. Mas as suas casas estão vazias e o seu dinheiro não é gasto aqui, excepto para pagar super-taxas, super-IMIs, electricidade e super-água que não consomem.
Veja-se então o fenómeno que aconteceu em Seia - fruto do rápido acréscimo seguido de mais rápida ainda perda de população: Até 1990 havia realmente MUITO MAIS gente do que os Censos indicam e, a partir de 2000, passa a existir MUITO MENOS residentes do que os indicados.
Portanto, os Censos falsearam sempre os número de Seia. Arredondando-os artificialmente. Antes por defeito e nos últimos anos por excesso. Mas se os Censos mascaram os números e dão jeito a alguns políticos, eles não modificam a realidade. Que atingiu, neste momento, níveis que eu - e muitos outros - consideramos claramente pré-caóticos. Tal como venho alertando desde 2002 de forma contínua e escrita.
5 - A perda da EHESE e da EDP / Hidrocenel
Seia perde a “sua” EHESE (que chegou a ter mais de 500 trabalhadores ao seu serviço) para a EDP nacional e em 94 esta sofre uma cisão dando lugar à Hidrocenel-Energia do Centro, SA, com sede em Seia, agora com pouco mais de 60 trabalhadores. E em 2004 a própria Hidrocenel acabaria por ser extinta definitivamente. Retirando, entre muitas outras coisas, quase meio milhão de euros por ano, em derrama, à Câmara Municipal.
O maior produtor e centro distribuidor de energia do Centro nos anos 70 fica inclusivamente sem um balcão para atender reclamações e se poder pagar a luz. No tempo em que, curiosamente, o Presidente da Assembleia Municipal era um alto quadro da EDP (Hidrocenel) local. E, logo no ano seguinte, quem o substituiria na Assembleia Municipal seria o ex-super ministro da Economia e Finanças do governo de Guterres, o senense Pina Moura, na altura já Administrador do gigante energético espanhol Iberdrola.
Resumindo: Seia perde todos os têxteis e depois perde toda a energia... e com o aval político local.
Como contrapartidas, a Hidrocenel transforma as instalações num call center que emprega, hoje, a quase totalidade dos jovens desempregados que ali são massacrados horas a fio sem poderem respirar para ganharem um mísero ordenado mínimo enquanto não emigram, e cede por vinte anos (está quase a acabar o prazo) as instalações da Central da Sra do Desterro para ali se construir mais um projecto anunciado como revolucionário e uma coisa do outro mundo... que, mais uma vez, saiu um fiasco total. O Museu Natural (???) da Electricidade - que reclama estar localizado em S. Romão, Guarda (tudo menos Seia) e do qual ninguém se lembra e ao qual ninguém vai por mais publicidade que se lhe faça. Acredito (e sei) que, à semelhança do CISE - outro elefante branco absolutamente inútil porque não há Inteligência para o pôr a funcionar, ou dinheiro, ou ambos - nem 10% dos senenses o visitaram. Quanto mais os turistas...
6 - PROMETE & ESQUECE, ilimitada
Desde os anos 2000 até à data... para além de tudo o que Seia perdeu, nada aconteceu de positivo.
Não se captaram empresas nenhumas mas anunciaram-se investimentos megalómanos (há 4 anos eram 90 e tal milhões) dos quais nem um cêntimo se verificou. Como sempre.
Eram as maiores pistas de ski da europa, era o complexo de golf da Jagunda, era a requalificação do rio Seia com uma entrada supermoderna, barcos, restaurantes. Hotéis, zonas de lazer, eram hotéis e mais hotéis que vinham para Seia, eram 90 milhões em investimentos... Tudo treta. Tudo insultos à inteligência de quem neles acreditou.
Nada, absolutamente nada do prometido nas primeiras páginas dos jornais do regime se verificou. Nada. Que é para não haver chatices com ninguém. A única empresa que veio para a Zona Industrial fantasma da Abrunheira fê-lo por não ter lugar em Oliveira do Hospital. Um dos tais concelhos que NÃO ADORMECEU e continuou a trabalhar paulatina mas permanentemente. De forma que ultrapassou já REALMENTE Seia em população. Em empresas e comércio nem se fala. A sua ZI está repleta e tem 50 lotes. Fora as muitas empresas industriais que estão quase todas fora dessa ZI
E o tempo foi passando. E as pessoas eleitas com os nossos votos limitaram-se receber os seus ordenados ao fim do mês. Muitos deles - demasiados - arranjaram o emprego estável que nunca teriam de outra forma. Porque nem habilitações literárias tinham para tal.
E por 4, 8, 12... 30 anos.
Mas Seia nada ganhou com os empregos arranjados a esses boys. Porque nem eles nem quem lhes arranjou os tachos se preocuparam minimamente em cuidar de Seia. Preocuparam-se - isso sim - em manter o seu próprio emprego e de preferência com uma componente de poder... Ouro sobre azul. Convenhamos que passar de desempregado a decisor no que respeita a muito dinheiro e a milhares de pessoas, faz bem ao ego de muita gente.
E por isso, por nada se fazer DE IMPORTANTE em prol deste concelho, Seia parou mesmo no tempo, tal como Eduardo Brito prognosticava na sua célebre frase publicitária: Seia, onde o tempo pára e a saudade fica. Realmente o tempo por aqui parou. Mas não só parou. Andou para trás, ao estagnar.
Porque outros concelhos andaram para a frente. E sem terem o Pão e o Queijo e a faca para os cortar que a Providência decidiu entregar-nos de mão beijada: a porta de entrada da Serra da Estrela. Mas que em vez de entrada, nós conseguimos vir transformando, ano após ano, em de saída.
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Depois desta longa mas (julgo) necessária introdução, vou finalmente explicar porquê. Porque é que Seia estagnou, mirrou, despovoou mais do que qualquer concelho vizinho... e, apesar de ter tudo para singrar, não desenvolveu.
Fator 1 - “Olha, rapaz: o senense acomoda-se a tudo e não tem espírito reivindicativo nem de investidor.” - prof Ferreira, delegado escolar nos anos 60.
Mesmo após o 25 de Abril e no verão quente poucas ou nenhumas foram as manifs vigorosas que se realizaram aqui em Seia. E a RTP mostra, no seu arquivo, que as pessoas se manifestavam, quando o faziam, em grande espírito de confraternização. Não havia ali intenção de lutar a sério fosse contra o que fosse, ou a favor do que fosse, mas apenas de passear e conviver em grupo, mostrando pouco mais que uma vontade ou até mesmo um pedido. Eram realmente mais petições em passeio do que manifs, de facto.
E isto enquanto o país fervilhava e era colocado a ferro e fogo com elas...
“O senense vai arranjando emprego na Câmara, no Tribunal, nas Finanças... e pronto. Fica acomodado. Não precisa de se chatear mais. A partir da cunha que lhe arranjam, faz vida de café. O que vem de fora é que cria as empresas, abre as lojas, dinamiza a economia.” - vox populii década de 70.
Se aliarmos esta despreocupação pelo que o rodeia com um certo incómodo relativamente ao turista que nos visita e lhe tira o lugar na mesa do café e no restaurante ao domingo, poderemos explicar também a falta de iniciativa privada no que ao turismo diz respeito.
Repare-se: enquanto a Covilhã tem 6 hotéis e uma quantidade de residenciais, Seia teve sempre e só UM ÚNICO hotel, uma Estalagem fechada há anos, uma outra que só abre no inverno, e um segundo hotel que se ficou pelo esqueleto.
Esta impressionante realidade pode ser explicada pela falta de iniciativa privada a que se referia o prof Ferreira, mas também - e mais provavelmente - porque os empresários não detectam retorno a curto / médio prazo na actividade turística. Pelo contrário. Já lá iremos.
Ora este “bom” feitio senense do "deixa andar" e do "não te rales" pode explicar também a falta de reivindicação do cumprimento das sucessivas promessas eleitorais. Que lhes são repetidas vezes sem conta, eleição após eleição, mas nunca cumpridas.
Algo que seria impensável num concelho do Norte. Ali, quem não cumpre escusa de se candidatar novamente porque será fatalmente arrasado nas urnas.
Aqui é ao contrário. Nenhum presidente da câmara precisa de cumprir seja o que for, que será eleito na mesma. Por causa do factor seguinte:
2 - A “tra(d)ição” Socialista
Por ter sido um grande centro proletário e laboral, quando se deu o 25 de Abril, a maioria da população senense, em revolta contra o regime Salazarista / Marcelista optou naturalmente por uma via política de esquerda. O PCP nunca teve grande implantação aqui - ao contrário do que se passou em Loriga, por exemplo - mas o PS, pela mão de alguns sonhadores - em que se incluía o meu Pai - foi o primeiro partido a organizar-se em Seia. Eu recebi o primeiro cartão da Juventude Socialista que era amarelo e escrito à máquina com letras vermelhas e lá fui ajudando na nossa primeira sede, na Av dos Combatentes onde mais tarde existiu o snack bar Scala. Ali eu, em 1974 e com apenas 14 anos, vendia pins, canecas, porta chaves, emblemas, organizávamos as colagens de cartazes e tentávamos angariar mais militantes sempre com muita dificuldade porque “era ainda muito perigoso”, diziam-nos.
Um belo dia, mudámos de sede para o edifício onde se encontra hoje a Biblioteca Municipal. E pouco depois aparecem uns tipos a alcatifar o chão, que era de soalho podre. Por ordem de alguém que por respeito à sua memória não referirei. Nesses dias entraram para o partido, de uma só fornada, 70 ou 80 militantes. Todos trabalhadores da indústria têxtil. Já eram muito mais do que nós, os pioneiros. Por isso, logo na próxima eleição para a comissão política tomaram literalmente conta do Partido, em Seia, e indicaram o nome do sr “Jorge da Fisel” (Jorge Correia - contabilista ou “guarda livros” na época) para candidato à Câmara.
O PS acabou logo ali para mim e para o meu Pai - porque aquele assalto era exactamente o oposto à democracia que propalávamos pelas freguesias - e assim tivemos os primeiros 8 (9 aliás) anos de poder local. De 76 a 85. Em 89, Jorge Correia não consegue o apoio do PS - que tinha sido “tomado” pelo seu delfim Eduardo Brito; e concorre pelo PSD, vencendo pela única vez o PS (partido de quem sempre fora a Face) por meros 60 votos.
Tivemos os únicos 4 anos de governo PSD, ou melhor: de Jorge Correia na mesma, agora no PSD, sem se perceber bem o que tinha mudado neste vira-casaquismo que muitos nunca lhe perdoaram.
E, por isso, J. Correia perde as seguintes eleições contra o seu rival, Eduardo Brito, do PS, em 1993, numa campanha em que eu próprio participei trabalhando com ele o teor dos discursos e os aspectos cénicos e timmings do discurso de vitória. Reuniões pela noite dentro, na Cova da Moira, na Sra do Desterro que, na altura, era um bar e restaurante de E Brito. Bons tempos. A primeira entrevista que Eduardo Brito dá para uma rádio depois de eleito foi nessa mesma noite das eleições e a partir do meu carro para a Rádio Beira Alta, para o José Luis Dias, durante a caravana da vitória. Eduardo Brito nunca mais perderia qualquer eleição até à sua saída em 2009. E saiu, 16 anos depois de eleito pela primeira vez, não porque tivesse chegado ao limite do nr de mandatos (ainda tinha mais um), mas porque assim o decidiu. Não quis que se dissesse que “ficava agarrado ao poder até o porem na rua”.
Filosofia que parece não ter colhido adeptos depois disso.
A Eduardo Brito sucede, novamente, o seu próprio número 2, numa dinastia que aqui em Seia faz, estranhamente, jurisprudência. Não é este, concerteza, o objectivo de um regime democrático. É, aliás, esta uma chocante subversão do mesmo. Mas neste caso eu tenho que me retratar publicamente, pois fui um dos que pressionou Eduardo Brito a espicaçar o seu número 2 para avançar. Tínhamos todos muita esperança em que um “jovem” da minha idade, inteligente, pudesse conferir a Seia o impulso que nitidamente lhe faltava há já muitos anos. E Brito era dinâmico mas não o suficiente. E também estava cansado.
Note-se que à época eu já era adversário de E. Brito e a razão foi essa mesma. Porque Seia não mexia e eu acreditava piamente - e ainda hoje o creio - que, com Nuno Vaz, Seia teria tido um fulgor maior que o que tem hoje Oliveira do Hospital. Muito maior. Seia teria hoje muito mais gente, empresas, movimento. Ou Nuno Vaz ter-se-ia demitido se o não tivesse conseguido. Nuno Vaz estava muito à frente tanto do executivo como até do seu próprio partido. Foi mais um grande azar para Seia, que passou mais 4 anos e mais 4 e mais outros 4 anos absolutamente parada. Imóvel. Sem mexer uma palha. Com os mesmos faits divers do costume, à semelhança da semelhança dos anos anteriores e dos outros anos ainda mais anteriores que foram todos semelhantes à desgraça que nos aconteceu.
Mas de positivo? De concreto? De BOM para a Economia local? Nada. Foram 30 anos de endividamento absurdo para se conseguir... pouco mais do que NADA. Isto para dizer que enquanto os sucessivos executivos se entretinham a entreter o pessoal, à semelhança dos anos anteriores, Seia continuava a perder empresas e população e a envelhecer. Não à semelhança dos anos anteriores, mas como nunca.
Voltando ao tema principal: tendo sido colega de escola de Filipe Camelo desde a 2ª classe até ao fim do liceu, colega de Universidade em Coimbra, e recentemente deputado municipal e director da campanha do PSD no mandato anterior - contra Eduardo Brito - garanti a Filipe Camelo em 2009 que se fosse ele o candidato do PS à CMS eu nunca concorreria contra si. Ele assim foi e eu assim fiz. Mas fiz muito Mal.
É por isso que, volvidos 8 anos, tenho mesmo que pedir desculpa a todos os senenses. Mas também nem eu nem ninguém que o conhecesse poderíamos imaginar alguma vez que isto pudesse correr tão mal. Ou melhor: não correr NADA. E que as pessoas que conhecemos, em 8 anos, tivessem a coragem de FAZER COISA NENHUMA que se veja em concreto e em prol da sua Terra.
Estou sinceramente em choque. Relevei a custo o seu primeiro mandato porque mesmo assim lhe quis dar uma segunda oportunidade mas realmente vejo que não há condições. Kaput. Filipe Camelo era um excelente nr 2 de qualquer presidente mas nunca deveria ter passado disso. Ponto. Mas eu também tive culpa nisso. Por isso me penitencio. Mais um grande azar para Seia e mais 8 anos absolutamente perdidos. Só que agora já não estávamos em condições de perder mais tempo. Os anteriores 22 quase perdidos, ainda vá lá, mas agora tínhamos MESMO que ter lutado MUITO e lutar DURO para trazer empresas para Seia, para manter as estradas abertas no Inverno, para atrair turistas, para dinamizar a nossa economia local ajudando-a a crecer em vez de a estrangular com taxas, impostos e o IMI mais caro do país. Custa O DOBRO viver em Seia do que em Oliveira. Até a água aqui é muito mais cara do que lá e vai daqui para lá, pelo menos parte dela. Como é isto possível??? Nestes últimos anos tivemos a ÚLTIMA oportunidade para evitar o colapso eminente de Seia. Pois foi exactamente AGORA que Seia parou ainda MAIS. E assim vai continuar mais 4 anos. Até não haver aqui mais ninguém. Até Seia ser transformada numa aldeia recondita do Interior. Deixaram MORRER completamente a minha Terra. Porquê?
Não há UMA ÚNICA pessoa que diga nas ruas que Seia está Bem e se recomenda. NEM UMA! Toda a gente diz que não sabe como vai sobreviver dentro de pouco tempo. O estado de Seia é pré caótico e eu desafio qualquer vereador a percorrer as ruas da Cidade e a perguntar aos comerciantes se estão satisfeitos, se estão ao menos bem. Se acham que vão conseguir aguentar a pastilha mais 4 anos. E a resposta é incondicionalmente: NÃO! NÃO! NÃO! Seia está a morrer. Milhares desertaram. O comércio não tem clientes. Indústria quase não há. Turismo? Quando há neve cortam as estradas. Quando elas estão abertas o movimento é o décuplo. Toda a gente vê isso mas ainda há quem as queira manter fechadas. O que faz a Câmara? Associa-se ao menos às preocupações dos Cidadãos? Nada. Calada. Muda. Queda. A ver o tempo passar e - mais uma vez - a nada fazer. A não tomar posição perante tão grotesco e fatal atentado à economia da região. Cada dia de fim de semana em que as estradas estão fechadas são 250 mil euros que a região mais pobre da Europa (Pordata) perde. E alguém na Câmara de Seia se preocupa com isso?
Não. É tudo a assobiar para o lado. Ontem, sábado, corri 3 floristas para comprar um ramo de rosas para a minha Mãe. Duas estavam fechadas e na terceira estive lá dentro o tempo que quis, sozinho, com as luzes apagadas. Foram 10 €. Paguei com 20 e a senhora - muitíssimo profissional, por sinal - não tinha troco. No fim de uma manhã de sábado!!! Tive que ir a correr trocar a nota num café. A senhora estava desesperada. Não há ninguém a comprar coisa nenhuma. A um sábado?!
Mas o que é que esta gente fez à minha Terra???
Ora: este é o diagnóstico de toda a gente que eu conheço. E eu conheço e falo com muita gente. A pergunta é: Então mas porque é que as pessoas votam sempre PS em Seia para as autárquicas quando depois para as legislativas votam PSD, por exemplo?
A minha resposta é esta: a Tra(d)ição Socialista. Que se consubstancia nos 3 pontos seguintes:
1º Pelo factor dinástico PS atrás explicado: Jorge Correia lega ao delfim Eduardo Brito que lega ao delfim Filipe Camelo. O que vem é sempre delfim do anterior. O que extende e perpetua a percepção do exercício do anterior no poder, por assim dizer. Do tipo: “Este vai-se embora mas fica lá o delfim, se precisarmos de alguma coisa falamos com este que ele resolve ou mete uma cunha para o delfim resolver”.
No caso J. Correia / Eduardo Brito, como acabaram por se zangar e J Correia ganhou primeiro sendo derrotado por E. Brito a seguir, a coisa funcionou de forma mais complexa. Foi uma vingança típica do PS reunido em força contra o “vira-casacas” e contra o PSD que teve a ousadia de lhes roubar meio trono. Também se pode desenvolver este assunto noutro capítulo.
2º Pelo factor “Caciquismo Pro”. Que explano a seguir
3º E - apenas desta vez - pela chocante falta de um candidato que personifique uma alternativa minimamente credível.
2º O Factor Caciquismo Pro
Seia é - e sempre foi - terra de caciques. Isso vem do ambiente fabril. Que se estendeu depois à política. Cacique é o capataz, o homem de mão do Senhor, o que faz o trabalho no terreno, convencendo a bem ou a mal as populações a seguirem um determinado comportamento.
“Se seguires este caminho, a vida vai correr-te bem a ti e a toda a tua família (e daremos emprego aos teus filhos, por exemplo). Se não seguires este caminho vais arranjar problemas para toda a tua vida e nem sei bem o que te pode acontecer a ti e aos teus”. Isto é o caciquismo basilar. Cru. Mafioso. Não é o nosso.
O nosso caciquismo português sempre foi mais polido. Não se ameaça ninguém, toda a gente é livre de votar em quem quiser, mas... “se algum dia precisares de alguma coisa (frase mágica!) já sabes que primeiro temos que ajudar os amigos”.
Não se prometem empregos de forma descarada mas... “vai abrir um concurso e há uma vaga para tal cargo, ele que concorra e a gente depois cá vê”. Isto passa-se, ao que se lê na imprensa, de norte a sul.
Não posso afirmar peremptoriamente e por escrito que é isto o que se fez toda a vida em Seia. Porque não arranjaria testemunhas para o irem confirmar em tribunal. Mas digo que é isso o que as pessoas ao longo de 3 campanhas eleitorais que fiz em Seia, desde 89, e uma na Guarda, me disseram sempre. Sempre. Sem excepções. Custa a acreditar que isto seja completamente mentira.
Se hoje em dia se continuam a prometer empregos e benesses? Note-se que eu me refiro apenas aos CACIQUES e não a quem está no poder. Mesmo assim acho sinceramente difícil. Mas que até há poucos anos era assim que se trabalhava em todo o país, ninguém tem disso a menor dúvida. E isso fez história e encara-se até como “procedimento normal”. “Todos tentam manter o seu tacho. Por isso... não se pode levar a mal”. Vox populii
A verdade é que quem consegue atingir o poder naturalmente se rodeia de gente “influente” na sua Terra ou na sua profissão, organização, Instituição... que trata de convencer os outros a votar no seu candidato. É crime? Posto desta forma, não. É campanha eleitoral 365 dias por ano. Mas levada consecutivamente a efeito durante 30 ou 40 anos podem crer que funciona.
O QUE VAI ACONTECER A SEIA NOS PRÓXIMOS 4 ANOS 3º - A chocante falta de um candidato que personifique uma alternativa
O “chocante” aqui é mesmo propositado. Veja-se que depois de um diagnóstico destes (que por ninguém minimamente sério pode ser desmentido) de 8 anos de puro marasmo, o PCP ainda não apresentou candidato e o PSD vai apenas apresentá-lo esta noite. Dia 2 de Abril de 2017. Que vai ser a própria presidente da CP, já que não arranjou quem aceitasse ir.
Não há palavras para descrever um tamanho amadorismo em quem pretende disputar umas eleições.
Estamos em Abril. A não ser que os candidatos a apresentar pelo PSD e pelo PCP fossem figuras nacionais é mortalmente tarde para qualquer tipo de ação de campanha eficaz em termos de apresentação do candidato às populações e de captação da simpatia popular a ponto de conseguir a inversão do voto tradicional à esquerda.
Pior: se a candidata do PSD for a anunciada, os próprios militantes prevêem o pior resultado de sempre. E, curiosamente, muitos esfregam as mãos de contentes. É simplesmente surreal e inacreditável o ponto a que este PSD de Seia chegou.
Realmente este era o ano em que um bom candidato do PSD poderia ganhar. Filipe Camelo vai perder os 1500 votos do costume, bastaria ao PSD recuperar os números de Nuno Vaz (já nem era necessário os de Luis Caetano) e capitalizar esses mesmos descontentes... e tinha isto ganho. Nunca acontecerá com a actual candidata, claro. Tinha que ser um candidato muito popular, como Luís Caetano ou um independente credível.
Mas nada disso acontecerá e teremos, pois, pela frente mais uma vitória esmagadora de Filipe Camelo que, sem nada fazer, “à semelhança dos anos anteriores”, se passeará por estas eleições sem ter cumprido um único objectivo das anteriores; nem concretizado um cêntimo do investimento de 90 e tal Milhões prometidos para Seia há 4 anos.
Mas lá está. Se não há concorrência credível, o povo vai votar em quem?
Há aí um movimento a promover o voto em branco, como protesto por este estado caótico de coisas na política e na Vida de Seia. Para chamar a atenção para o descontentamento popular pela continuidade do marasmo e pela falta de alternativas política e reconhecidamente credíveis.
E, embora esse voto não sirva para nada estatísticamente, se até lá não aparecer ninguém minimamente credível, será seguramente o meu.
2/04/2017

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