11.06.2017

D. Dinis fez tudo quanto quis... MENOS plantar o Pinhal de Leiria.

Faz hoje 3 semanas que Portugal ficou gravemente ferido pelos maiores incêndios da História e sobressaltado por um grande drama: tinha ardido o pinhal de Leiria, o tal que tinha sido plantado por D. Dinis.


Bom. Isso é mais uma peta que nos contam - como 90% do que nos contam sobre seja o que for, em Portugal - e eu vou dizer-vos o que realmente fez D. Dinis. Que foi um magnífico Rei e fez muito mais do que mandar plantar um pinhal. E isso ele não fez.

No reinado de D. Dinis Lisboa passa a ser a Capital de Portugal. Provavelmente em 1255. Os altos tribunais têm a sua sede em Lisboa. D. Dinis é o primogénito de D. Afonso III mas havia um problema.

Ele é filho da D. Beatriz mas a primeira mulher de D. Afonso III, a tal condessa de Bolonha, ainda era viva, e portanto D. Dinis não era filho legítimo enquanto o casamento de seus pais não se legitimasse.

Os irmãos lançam-lhe, pois, uma guerra. A primeira Guerra Civil portuguesa de que muito pouco se sabe porque não havia cronistas nesta altura. A também denominada Guerra de Portalegre. De que D. Dinis sai vitorioso. Aos 18 anos é coroado Rei.

Os reinados juntos de pai e filho prefazem 77 anos. E durante todo esse tempo Portugal nunca deixou de crescer. O comércio em particular desenvolveu-se muito.

Em 1293, D. Dinis confirmou a Bolsa Marítima que era uma organização dos mercadores portugueses que faziam um depósito de uma parte dos seus lucros para cobrir os prejuízos das viagens, tais como naufrágios. Aqui nasceram os Seguros em Portugal.

Outro sinal de progresso foi o decreto que instituiu o uso obrigatório da Língua Portuguesa nos documentos oficiais, sendo declarada o idioma oficial. Nasce, pois, o "Português" que substitui o Latim em todos os documentos.

Já antes, em 1288, o rei tinha conseguido do Papa autorização para que funcionasse em Portugal o futuro Estudo Geral (Universidade). Que,devido às queixas da população, passou para Lisboa e novamente para Coimbra e novamente para Lisboa até que se fixa finalmente em Coimbra.

Para o conseguir, D. Dinis teve que fazer as pazes com o Papa que tinha excomungado Portugal no tempo de seu Pai, Afonso III, por este ter proibido as doações à Igreja.

Os bens da Igreja não pagavam impostos e o Estado não via um cêntimo de todos aqueles infindáveis terrenos e propriedades que o povo, na hora da morte, legava à Igreja para remissão dos pecados terrenos. Foi assim que a Igreja enriqueceu. Mas com isso prejudicavam-se fortemente os cofres do estado.

É preciso recordar que nessa época em Portugal - um povo muito católico e crente - não se dizia missa, não se baptizava nem se sepultava ninguém em solo sagrado devido à excomunhão de Afonso III e de Portugal.

D. Dinis compilou as 40 queixas dos bispos e conseguiu negociar com o Papa a Concordata dos 40 artigos. Para cada queixa se arranjou uma solução.

As fronteiras terrestres foram delimitadas pelo tratado de Alcanizes. A partir daí, o Portugal Continental manteve praticamente constante a sua configuração. À excepção de Olivença e pouco mais. Um dia destes lá iremos. Somos uma das nações do mundo com mais antigas fronteiras.

Um outro ponto muito importante desta época é a criação da Ordem de Cristo. O Papa tinha extinguido os Templários e tentava confiscar os seus Bens. O Rei D. Dinis tinha acabado a guerra com os mouros em terra, com a conquista do Algarve. Mas essa guerra prosseguia no mar e aí quem estava especialmente incumbido da guerra contra os mouros eram os Templários. E agora os Cavaleiros da Ordem de Cristo. E é por isso que os navios dos Descobrimentos ainda trazem nas velas a Cruz da Ordem de Cristo.

E que mais fez D. Dinis? Fundou vilas novas, instituiu feiras, mandou enxugar pântanos, construiu mosteiros e fortalezas. É impressionante a lista de obras que consta na Crónica de D. Dinis de Ruy de Pina.

Para além de centenas de casais que se tornaram aldeias - e algumas até vilas e sedes de concelho sobretudo no Minho - ele construiu Serpa, Moura, Olivença, Campo Maior, Monforte, Arronches, Portalegre, Marvão, Castelo de Vide, Borba, Vila Viçosa, Arraiolos, Alandroal, Monsaraz, Juromenha. E a torre de Beja. E na Beira ainda fez Avô, Sabugal e Castelo Rodrigo.

O número de feiras aumentou imenso. Só até ao fim do sec 13 há 30 novas feiras em Portugal. E feiras francas onde os comerciantes não pagavam impostos.
(Nenhuma delas é a Feira Franca de Viseu, a mais antiga que chegou aos nossos dias. Esta foi instituída mais tarde por D. João I em 1392).

Aumenta a moeda circulante, a extensão dos campos arroteados quase duplica, e com isso cresce a produção de azeite e vinho que os mercadores ambulantes compram nas feiras locais e vão vender no Mediterrâneo, no Norte de África, na Flandres. E com isso as alfândegas conseguem grandes rendimentos.

O Rei de Portugal casou com uma filha do Rei de Aragão, a princesa Isabel que vem a ser a famosa Rainha Santa. O casamento fez-se primeiro por procuração em Barcelona e depois realizou-se com grande solenidade na vila de Trancoso.

Esse casamento foi um acontecimento muito importante na História de Portugal. Pela personalidade da Rainha Santa que se vai revelar uma grande defensora da Paz, tanto no plano interno - porque o pais estava dividido em frações que se degladiavam de morte - como no plano internacional em que ela procura que Portugal viesse a ter uma posição de árbitro entre as várias nações Hispânicas. A Rainha, em virtude dessa sua acção, foi sendo rodeada, ainda em vida, por uma espécie de auréola de Santidade. O povo atribuía-lhes milagres e ela vem a ser beatificada ainda no Renascimento pelo Papa Leão X e depois canonizada no sec 17 pelo Papa Urbano 18.

O reinado de D. Dinis termina tragicamente. O rei tinha um único filho da Esposa, o Infante Afonso (que viria ser IV), mas fora do casamento tinha vários filhos bastardos e tinha uma grande predilecção por um deles, o D. Afonso Sanches. Uma predilecção tal que o fez nomear Mordomo Mor do Reino, o equivalente a Primeiro Ministro.

O herdeiro do reino chegou a acusar o pai de o querer substituir no trono pelo irmão e revoltou-se abertamente. Esta é a explicação "normal". Uma questão puramente de sucessão. Mas, como sempre, não foi só isso.

Por detrás da guerra civil havia contradições muito mais profundas. A acusação que o Infante revoltado fazia a seu pai era a de que ele não "governava com justiça". Quer dizer: não mantinha o equilíbrio entre grandes e pequenos. Fazer justiça era proteger os pequenos contra a cobiça e a ganância dos grandes. E a revolta, no fundo, era esta.

Ora, é verdade que a partir do inicio do séc 14 - ano de 1300 - o rei D. Dinis deixa de convocar as cortes, dá proeminência aos grandes nobres e às grandes doações e alguma razão tinha o Infante e as forças que o apoiavam para se revoltarem.

A guerra, com pequenos intervalos, durou desde 1320 a 1324. Toda a gente estava contra D. Dinis incluindo a Rainha Santa. Mais: a Rainha Mãe de Castela, D. Maria de Molina, chega a escrever a D. Dinis, sugerindo-lhe que abdique em favor de D. Afonso. Do lado do infante há poderosas forças - e claro, também o povo - contra os quais o Rei não pode fazer nada.

D. Dinis chegou a apelar ao Papa para que repreendesse o filho. E ele assim fez, numa bula ameaçando excomungar o Infante revoltoso se não depusesse armas. Mas sem efeito. O Rei apelou igualmente ao Bispo de Évora para que viesse a Estremoz para convencer o seu filho a depor as armas. Mas também em vão. O Bispo foi morto e cortado em bocados na Torre de Estremoz.

Na véspera do último combate em Santarém, foram contar as lanças. Do lado do Rei só havia 40 lanças e do lado do povo havia 320.

Por fim, o Rei foi obrigado a expulsar do país D. Afonso Sanches, e teve ainda que afastar os ministros mais odiados pelo povo. Mas D. Afonso Sanches vai aparecer mais à frente na História, no episódio da morte de D. Inês de Castro, uma história muito obscura com muitas ramificações e interpretações, que já contei ao de leve nestas páginas.

D. Dinis acaba o seu reinado em desgraça. Nos últimos anos da sua vida D. Dinis não mandava nada. Era já o seu filho, futuro Afonso IV, o verdadeiro Rei de Portugal.

Foi isto, em traços largos, o que D. Dinis fez e o que lhe aconteceu. Quem começou a plantar o pinhal de Leiria foi D. Sancho II e quem terminou de o fazer foi D. Afonso III, pai de D. Dinis.
Este, o máximo que pode ter feito, foi aumentá-lo.
 Mas nem isso é garantido.